Relacionamentos simultâneos, como por exemplo do famoso por suas músicas recheadas de sensualidade, o funkeiro Mr. Catra, falecido recentemente, chamava atenção também fora do palco: declarava publicamente viver em união poliafetiva e ser pai de 32 filhos, entre biológicos e adotados, além de ter outros relacionamentos paralelos.
Incomum, esse estilo de vida desperta curiosidade também quando se pensa na partilha de bens. Quando o provedor do grupo falece, como fica a divisão do patrimônio acumulado ao longo de uma vida? Quem tem direito à herança?
A advogada especialista em direito de família, Regina Beatriz Tavares da Silva explica como o Judiciário brasileiro enxerga esse tipo de relacionamento.
Herança
Considerando a hipótese de que um homem que viva em uma união poliafetiva venha a falecer, não tenha sido casado legalmente com qualquer uma das integrantes do grupo e não tenha deixado testamento, os bens acumulados em vida serão partilhados apenas com seu primeiro companheiro (a).
“O patrimônio adquirido em seu nome, onerosamente, durante a relação de poligamia, chamada de relação poliafetiva ou poliamor, será dividido somente com a primeira mulher, o que se chama de meação. Essa mesma mulher terá direito também à herança sobre os bens particulares do falecido, compostos por aquilo que foi comprado antes do início da relação e o que foi adquirido por herança ou por doação, anteriormente ou durante a relação”.
As demais integrantes do relacionamento não terão direito à meação e à herança, pois o sistema vigente no Brasil e estabelecido pela Constituição Federal é a monogamia. “Por isso, a princípio, a preservação se destina à primeira mulher e não às que depois passam a ter relação com o mesmo homem. No Brasil a monogamia é a norma constitucional, que vigora obrigatoriamente em todas as leis que estão abaixo da Constituição Federal, daí a possibilidade de constituição de uma única união estável, limitada a duas pessoas, sejam de gêneros ou sexos diferentes, sejam do mesmo sexo.
O risco de que o entendimento do Poder Judiciário seja o de que “não houve união estável nem mesmo com a primeira mulher, a depender das circunstâncias, caso em que nem mesmo a primeira mulher terá direito a bens deixados pelo falecido, que seriam atribuídos somente aos filhos do falecido.
Pensão
Quando o falecimento dá direito à pensão previdenciária do INSS, o benefício será recebido apenas com a comprovação de que houve união estável, conforme a Lei da Previdência Social. As demais não terão direito a receber a pensão previdenciária.
Filhos
Com relação aos filhos originários dessa união, sejam biológicos ou adotados, eles são sempre iguais perante a lei. “Retirada a meação da primeira mulher, se for o caso, os filhos terão direito a receber o restante da herança em partes iguais”.
O mesmo raciocínio vale para a pensão da previdência social (INSS). O valor será dividido entre a primeira mulher, se reconhecido que teve uma união estável com o falecido, e todos os filhos menores de idade, ou será atribuída somente aos filhos menores de idade.
O sistema jurídico brasileiro e todas as suas leis são apoiadas na monogamia, o que impede a lavratura de documentos que tentem formalizar esse tipo de relacionamento.
“Temos de lembrar que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) vedou a escritura de poligamia como união estável, então, mesmo que numa relação poligâmica ou poliafetiva tenha sido assinado um documento desse tipo, esse documento não valerá para a aplicação das regras de Direito de família, do Direito das sucessões e do Direito previdenciário, porque o documento é nulo”.
Regina Beatriz Tavares da Silva é advogada especialista em direito de família e presidente da ADFAS (Associação de Direito de Família e das Sucessões).
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