As palavras fazem parte da minha existência. São tantas as palavras que habitam minha cabeça, que sinto necessidade, as vezes sem conta, de pô-las para fora. E, só em dizê-las não me faz contente. Não me satisfaço!

Preciso, então, me ausentar de mim mesma, e numa folha em branco ir esvaziando aos borbotões todas as palavras que me enchem a alma e moram dentro de mim. Soltando-se assim quase sem pensar, num turbilhão de pensamentos que as vão unindo em cores, forma, sons, dando-lhes uma aliteração tão forte, uma musicalidade própria que, para que não me fujam, mesmo sem uma rima sequer, as enfeixo, amarrando-as umas às outras, as aprisiono em poemas. São minhas palavras, são meus os poemas.

Poemas estes, nem sei ao certo, se servirão para agradar alguém, mas que a mim, fazem um enorme bem.

Gosto das palavras. Sempre gostei das palavras.

Palavras são como pedaços da gente, desvendam nosso íntimo, revelam nossos sentimentos mais profundos, e denotam nossa alegria ou tristeza. Deixam à tona nossos desafetos.

Um bom observador, saberá ao lê-las, decifrar o estado de nossa alma, juntando pedacinhos unidos em frases mesmo que esparsas, irá com elas formar orações e lá estará à sua frente o verbo que nos habita, a nos revelar inteiramente.

Minha fragilidade sempre esteve em minhas palavras. Falo sempre do que em mim faz morada. Como diz o livro dos livros, a boca fala do que o coração está cheio. Desde menina já era assim decifrada pelas palavras que dizia, ou, até pelas que deixava de dizer. E minha mão sabiamente a me repetir:

– Minha filha, as palavras são sua alma, sua palma.

Engraçado como pessoas que me conhecem de perto, ao trocarem comigo apenas duas ou três palavras pelo telefone, sabem de antemão dizer se estou alegre, triste, feliz, preocupada, ou seja, que sentimento for, que eu tolamente, pense estar guardando só para mim.

Assim fazem as palavras conosco, ora doces, ora amargas, ora nos agridem, ora nos amaciam, alegram nossa alma e fazem nos bater forte o coração. Longas demais, algumas vezes, não conseguem nos dizer nada. Não nos atingem! Curtas em outras, conseguem nos cortar a alma em pedacinhos.

Palavras são palavras, sejam duras, macias, secas, suaves…

Pouco importa. Serão sempre palavras e depois de ditas, não as conseguimos recolher jamais. Por isso toda palavra é bendita, pois até as malditas, algumas vezes, necessitamos dizê-las ou ouvi-las para acordar, deixando para lá as coisas que para trás ficam.

Assim, saindo de nós mesmos, começarmos ir à cata de palavras novas, esquecidamente guardadas, ou quem sabe ainda sem chances ou ousadia usá-las em nosso dia a dia. E, desta forma, sem que nos percebamos, sem expectativa alguma, vamos nos acostumando a elas, e as enfeixando em sutis sonoridades diferentes, e de repente, quando menos esperamos, lá está o recomeço de um novo poema com uma musicalidade até então por nós desconhecida. Pegamos nova fita a enlaçar um novo feixe.

 Sentimo-nos em ocasiões como essa, uma Penélope pós-moderna, tecendo um bordado de novas e sutis teias. Teias de palavras, riscando o papel qual esmeril riscando dissabores, derrubando a duração inútil dos rancores e o estéril arrependimento.

Palavras novas, loucas ou não, trazem eternas possibilidades.

Um brinde ao que está sempre em nossas mãos:

– A vida inédita pela frente, e a virgindade dos dias que virão!

Apenas palavras, nada mais que palavras! E precisa?

Ercília Pollice
Ercília Ferraz de Arruda Pollice reside em Campinas, é formada em Letras pela USC – Bauru, bacharel em Literatura Portuguesa. Escritora, conta com 10 livros publicados, entre eles livros infantis e juvenis, além de inúmeras crônicas e poemas. Integra a Academia Campineira de Letras e Artes e Academia Bauruense de Letras. Foi indicada para o Prêmio Jabuti pela autoria do livro infanto–juvenil “Só, de vez em quando” da Editora FTD. Ercília também é artista plástica catalogada no Cat. Júlio Lousada. Aquarelista, já realizou dezenas de exposições individuais e coletivas em diversos salões e galerias, inclusive em Paris. Alegre, de bem com a vida, adora relacionar-se. Sua preferência é escrever sobre relacionamentos em todas as áreas e níveis. Também tem uma queda por comentar fatos políticos e suas implicações, sempre com bom humor e alguma ironia. Poeta, fala só do amor. Quando escreve faz pinturas de palavras, sua arma maior. Quando pinta faz poemas de cores. Tem 3 filhos, escreveu vários livros e já plantou centenas de árvores. Agora, é desfrutar os bons momentos que a vida sempre oferece àqueles que tem olhos e ouvidos para ouvir e entender estrelas.
7 comentários para “ Palavras, apenas palavras, nada mais que palavras! ”
  1. Querida Ercilia
    Acho que vc se completa com textos. Muito.boa essa reflexão sobre as palavras. Como vc também ê artista plástica coloriu muito bem seu texto.
    Continue nos presenteando com seus pensamentos coloridos

  2. Palavras que nos habitam, nos atravessam e nos constituem como sujeitos de linguagem. Belo texto, composição que vai tecendo, com palavras, imagens tão cheias de significados. Obrigado, Ercília e plenamulher pela leitura.

  3. Lendo me veio a mente o “VERBO”.
    Deus criou com a palavra. Me parece uma boa analogia da criação, Deus não contendo em Si e explodindo em obras e mais obras até compor a Sua obra orima; o ser humano. Muito interessante olhar do ângulo do ser incontido por um impulso de se projetar na existência mais ampla, total e irrestrita. Parabéns pelo exercício mental.

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