Um levantamento nacional revelou que 24,7% da alimentação de crianças de até cinco anos no Brasil é composta por alimentos ultraprocessados. Os dados são do Estudo Nacional de Alimentação e Nutrição Infantil (Enani-2019), conduzido pela UFRJ com 14.505 crianças em 123 municípios e no Distrito Federal.
O consumo cresce conforme a idade: entre 2 e 5 anos, 30,4% da dieta diária das crianças já é formada por ultraprocessados. Entre bebês de seis meses a dois anos, a taxa é de 20,5%, um número preocupante, já que a recomendação oficial é evitar totalmente esse tipo de alimento nessa fase. O estudo também aponta que 60,6% das crianças menores de 2 anos consomem doces e açúcares, índice que chega a 80,4% entre as de 2 a 5 anos.
Dra. Juliana Alves pediatra e neonatologista, especializada em Pediatria Integrativa e Funcional, explica que esses números revelam um risco grave. “Nem todo ‘lanche rápido’ é inofensivo. Muitos produtos comuns na rotina das famílias escondem aditivos químicos, excesso de açúcar, sódio, gorduras de baixa qualidade e até substâncias com potencial cancerígeno”, alerta.
Os piores ultraprocessados para crianças, segundo a pediatra:
Bisnaguinhas: feitas com farinhas refinadas e com alto índice glicêmico, favorecem obesidade, resistência à insulina e alterações intestinais.
Requeijão: contém gorduras saturadas de baixa qualidade e aditivos artificiais, funcionando como alimento inflamatório e pobre em nutrientes.
Biscoito de água e sal: apesar de parecer “leve”, costuma conter pesticidas nos grãos, farinha refinada e óleos vegetais inflamatórios.
Bolacha recheada: mistura de açúcar, farinha branca e óleos refinados que gera vício alimentar, sobrecarga do fígado e prejuízo à microbiota intestinal.
Nuggets: preparados com carnes de baixa qualidade, amido, sódio e aditivos; podem conter nitrosaminas, substâncias associadas ao câncer.
Salsicha: rica em sódio e conservantes como nitrito e nitrato, que aumentam o risco de doenças metabólicas e até câncer quando consumida com frequência.
Além do impacto direto desses produtos, a médica lembra que a alimentação das crianças começa muito antes do prato delas. Durante a gestação e a amamentação, tudo o que a mãe ingere influencia a saúde do bebê, desde a formação da microbiota intestinal até a regulação da imunidade e do metabolismo. Já na introdução alimentar, o exemplo é determinante: se a criança vê frutas, legumes e comidas naturais na mesa da família, é muito mais provável que aceite e goste desses alimentos.
Na infância e adolescência, os hábitos do ambiente familiar continuam moldando escolhas. “Crianças que crescem em lares onde há refrigerantes, ultraprocessados e ‘comidinhas de pacote’ à disposição tendem a repetir esse padrão na vida adulta. Alimentação é um hábito coletivo: quando os adultos escolhem com consciência, as crianças naturalmente seguem o exemplo”, reforça a pediatra.
Para Dra. Juliana, cada refeição é uma oportunidade de educar e fortalecer vínculos. “Escolher o que vem da feira, preparar junto, sentar à mesa, comer com calma… tudo isso ensina a criança sobre saúde e sobre convivência. Cuidar da sua alimentação é, na prática, cuidar também da saúde do seu filho.”