Quando se fala em menopausa, a conversa gira sempre em torno de ondas de calor, alterações de humor e ciclos menstruais irregulares. Mas a verdade é que o corpo feminino grita de outras formas e quase ninguém está ouvindo. Sintomas como boca seca, coceira na pele, afinamento cutâneo, enxaqueca e mudanças drásticas na composição corporal continuam invisíveis, silenciados pela falta de conhecimento até mesmo entre profissionais da saúde.
“A mulher chega ao consultório dizendo que acorda com a boca colando, com uma coceira inexplicável pelo corpo ou com roupas que já não servem mais, mesmo sem ganhar peso, e quase sempre, ninguém associou isso à queda do estradiol”, afirma Fabiane Berta, ginecologista, pesquisadora e referência nacional em menopausa.
Um dos sintomas mais negligenciados, a boca seca, ou xerostomia, resulta da queda nos níveis de estrogênio, que afeta diretamente as glândulas salivares. A mulher começa a ter dificuldade para engolir, sente a garganta irritada, desenvolve mais cáries e infecções na gengiva, mas raramente alguém liga os pontos. “É impressionante como a saúde bucal da mulher menopausada ainda está fora do radar da medicina tradicional. E estamos falando de desconfortos que comprometem o sono, a alimentação e até a autoestima”, alerta Fabiane.
Outro sintoma subestimado é a coceira na pele, frequentemente confundida com alergias ou problemas dermatológicos. “Já atendi pacientes que passaram por inúmeros dermatologistas, usaram cremes, corticóides, fizeram testes de contato e ninguém pensou em olhar os ovários. A pele resseca, a barreira cutânea se rompe e a mulher coça até sangrar e o problema é hormonal”, explica.
O afinamento da pele, causado pela perda acelerada de colágeno, elastina e estrogênio, também é marcante. Pequenos machucados que antes não causavam preocupação passam a demorar semanas para cicatrizar, a pele das mãos e do rosto se torna mais fina, frágil, vulnerável e, mais uma vez, isso é tratado como “parte da idade” e não como um sinal de deficiência hormonal.
As enxaquecas também entram na lista de sintomas ignorados. Mulheres que nunca sofreram com crises passam a ter dores de cabeça intensas, enquanto outras relatam mudanças abruptas nos padrões habituais. “O cérebro da mulher responde diretamente ao estrogênio. As oscilações hormonais interferem na liberação de neurotransmissores e podem desencadear quadros neurológicos que seriam facilmente evitáveis com diagnóstico precoce e o tratamento adequado”, pontua a especialista.
E o corpo? Muda e muito, e não se trata apenas de ganhar peso. “A mulher olha no espelho e não se reconhece. A cintura desaparece, a gordura se acumula no abdômen, o músculo diminui e tudo isso acontece mesmo com alimentação equilibrada e atividade física regular”, destaca Fabiane. Essa redistribuição da composição corporal é consequência direta do declínio hormonal e tem impactos metabólicos sérios, como aumento de risco cardiovascular e resistência à insulina.
A médica lembra que os efeitos da menopausa se estendem para além dos sintomas visíveis. “Quando a mulher entra no climatério, quatro órgãos principais começam a sofrer: cérebro, coração, osso e músculo. A consequência disso pode ser infarto, demência, sarcopenia e osteoporose. E tudo começa com sinais que a maioria ignora”.
Segundo Fabiane, até 2030, mais da metade da população feminina brasileira vai estar na transição da menopausa ou no pós-menopausa. Um contingente de mais de 45 milhões de mulheres. “Estamos diante da maior corte de mulheres pós-reprodutivas da história do país e ainda assim, seguimos tratando a menopausa como se fosse um detalhe”.
A médica finaliza apontando que os sintomas menos falados precisam se tornar prioridade nos consultórios. “É justamente o que não está sendo dito que mais compromete a saúde da mulher. Está na hora de derrubar o mito de que a menopausa é só calorão e TPM eterna, não é. É uma mudança sistêmica e precisa de atenção proporcional à sua complexidade”.
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