Um estudo apresentado neste último domingo (11), no Congresso Europeu de Obesidade (ECO) e publicado na revista científica New England Journal of Medicine, revelou que o medicamento Mounjaro (tirzepatida), da farmacêutica Eli Lilly, promove uma perda de peso significativamente maior do que o Wegovy e Ozempic (semaglutida), da Novo Nordisk.
De acordo com os resultados do SURMOUNT-5, os participantes tratados com a tirzepatida alcançaram uma redução média de peso de 20,2% em 72 semanas, enquanto aqueles que utilizaram a semaglutida apresentaram uma redução de 13,7%. Isso representa uma perda de peso relativa 47% maior para a tirzepatida. Em termos absolutos, os pacientes que usaram tirzepatida perderam, em média, 22,8 kg, contra 15 kg nos que usaram semaglutida. Apesar de a Eli Lilly já ter divulgado dados preliminares em dezembro do ano passado, esta é a primeira publicação com os resultados completos.
O estudo também mostrou que 31,6% dos pacientes tratados com Mounjaro conseguiram perder pelo menos 25% do peso corporal inicial, percentual quase duas vezes maior do que os 16,1% observados entre os que utilizaram Wegovy. A superioridade da tirzepatida pode estar relacionada ao seu mecanismo de ação: o medicamento atua como agonista duplo dos hormônios intestinais GLP-1 e GIP, que influenciam a saciedade e o controle do apetite, enquanto a semaglutida age apenas sobre o GLP-1.
Ambos os fármacos apresentaram efeitos colaterais semelhantes, especialmente sintomas gastrointestinais como náuseas e vômitos, em geral de intensidade leve a moderada. O estudo reforça o potencial da tirzepatida como uma alternativa mais eficaz no combate à obesidade, embora a escolha do tratamento deva ser feita de forma individualizada e com orientação médica.
Apesar dos resultados promissores, as doses de Mounjaro utilizadas no estudo ainda não estão disponíveis no Brasil. Neste primeiro momento, o país contará apenas com as apresentações de 2,5 mg e 5 mg — doses iniciais para o tratamento do diabetes tipo 2.
Segundo Luiz André Magno, diretor médico sênior da Eli Lilly do Brasil, essas dosagens já são eficazes para a redução da hemoglobina glicada e do peso corporal em pacientes com diabetes. A empresa informou que trabalha para trazer as doses superiores ao país e aguarda a aprovação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para que o Mounjaro também possa ser indicado no tratamento da obesidade.
“Temos mais de um bilhão de pessoas que vivem com obesidade no mundo e, no Brasil, um em cada quatro adultos têm obesidade. Essa doença crônica é um grande desafio de saúde pública – temos estudos que mostram mais de 200 complicações relacionadas. Por isso, novos tratamentos com resultados tão positivos são importantes para contribuir para a vida de quem convive com essa doença tão prevalente”, disse em comunicado.
Chegada do Mounjaro ao Brasil
Recentemente, a farmacêutica Eli Lilly anunciou em comunicado que o Mounjaro (tirzepatida) chegará às farmácias brasileiras ainda na primeira quinzena de maio. A data de lançamento, que estava prevista para junho, foi adiantada e o medicamento já pode ser encontrado em todo o território nacional.
Aprovada em 2023 pela Anvisa, a caneta injetável é uma nova opção para o tratamento de diabetes tipo 2 e também vem sendo utilizada de forma “off label” para perda de peso. Concorrente do Ozempic e Wegovy (semaglutida), o Mounjaro foi alvo de diversas pesquisas clínicas, que apontaram um desempenho superior em relação aos demais medicamentos no que diz respeito a uma maior perda de peso e mais eficácia no controle da glicemia. Assim como o Ozempic, a nova droga também é administrada por meio de injeções semanais.
De acordo com Alessandra Rascovski, endocrinologista, a chegada do Mounjaro vem de encontro à enorme expectativa em relação aos efeitos da tirzepatida para o controle da glicemia e perda de peso. “Os resultados de pesquisas científicas e do uso do remédio no dia a dia mostraram que ele tem uma alta eficácia para controlar a glicemia e proporcionar perda de peso. No consultório, tenho recebido muitos questionamentos de pacientes a respeito do Mounjaro para o emagrecimento”, ressalta.
Um conjunto de estudos, conhecido como programa SURPASS, feitos com 19 mil pessoas com diabetes tipo 2 no mundo, incluindo participantes no Brasil, apontaram, nos exames que medem a hemoglobina glicada, que pacientes portadores de diabetes que usaram o Mounjaro apresentaram índices próximos de quem não tem a doença. Já outras pesquisas, que foram em busca de entender a relação do medicamento com a obesidade, demonstraram que a caneta de tirzepatida é segura para promover a perda de peso corporal, além de viabilizar uma porcentagem maior em relação ao Ozempic – 22% ante 14%, de acordo com um estudo feito pela americana Eli Lilly.
Alessandra ressalta que uma das grandes preocupações é que o Mounjaro seja visto como uma fórmula milagrosa de emagrecimento, cuja mensagem é impulsionada pelas redes sociais. “É importante que o uso do medicamento, assim como qualquer outra caneta de tratamento para diabetes indicada como opção off label para a perda de peso, seja acompanhado por orientação médica, pois o paciente pode não alcançar o efeito esperado, enfrentar percalços em sua jornada, incluindo efeitos colaterais severos, e, ao final, não ter um resultado satisfatório,, com risco de reganho de peso após a interrupção do uso”.
O Mounjaro será disponibilizado em seis versões, cujas dosagens partem de 2,5 mg e chegam a 15 mg de tirzepatida, possibilitando que o tratamento seja personalizado para cada caso. O valor mensal custará a partir de R$ 1400 (2,5 mg), válido para pacientes inscritos no Programa de Suporte ao Paciente da Lilly. Nas farmácias, o preço pode chegar a até R$ 1.907,29 para essa mesma dosagem.
Duplo agonista
De acordo com a diretora clínica, a tirzepatida é a primeira medicação da história que se encaixa na classe de duplos agonistas. “Enquanto a semaglutida imita a ação do hormônio GLP-1 (peptídeo-1 semelhante ao glucagon), para equilibrar as taxas de açúcar no sangue e regular o apetite, a tirzepatida imita o GLP-1 e o GIP (peptídeo insulinotrópico dependente de glicose), que também controla a glicemia e induz a sensação de saciedade”, ressalta.
O novo remédio se liga aos receptores de ambos os hormônios, envolvendo duas etapas. A primeira engloba a liberação de insulina, hormônio produzido pelo pâncreas responsável por retirar da circulação sanguínea o açúcar originado dos alimentos e colocá-lo dentro das células, quando será usado como fonte de energia. “Pacientes portadores de diabetes têm dificuldade de produzir a insulina ou ter sua ação efetiva no organismo. Nesse sentido, a glicose fica acumulada no sangue e ocasiona vários problemas de saúde, de ordem cardiorrespiratória, renal ou ocular”, explica a endocrinologista.
Já a segunda etapa de ação do Mounjaro aborda o controle de apetite. “Os receptores de GIP e GLP-1 também estão presentes em várias regiões do cérebro, relacionadas ao controle do apetite, da saciedade e do gasto energético. Com isso, o medicamento ajuda a regular os centros de recompensa que nos motiva a buscar o que dá prazer e assim melhora o comportamento alimentar, o que pode levar à perda de peso”, ressalta Alessandra.
Doenças crônicas em evolução
A chegada do Mounjaro ao mercado brasileiro é mais um capítulo importante para promover novos horizontes de combate ao avanço da diabetes e obesidade. Segundo a Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD), o país possui cerca de 20 milhões de pessoas portadoras da doença, o que corresponde a mais de 10% da população, e com projeções de crescimento de novos casos para os próximos anos.
Em relação à obesidade, o quadro é semelhante. Conforme dados da pesquisa Vigitel 2023, 24,3% dos adultos no Brasil são obesos – 1 a cada 4 no país. Até 2030, esse porcentual pode chegar a 30%, de acordo com o Atlas Mundial da Obesidade 2022.
Acessibilidade: o grande desafio
Além do lançamento do Mounjaro, o mercado vem se empenhando em novas opções de medicamentos para incrementar o leque de opções disponíveis para os brasileiros. Por exemplo, a queda da patente da semaglutida está prevista para ocorrer em 2026 e existem laboratórios já trabalhando em versões genéricas do Ozempic. Há também anúncios sobre a produção de opções a base de liraglutida, princípio ativo do Saxenda, com foco em obesidade e diabetes.
Alessandra Rascovski aponta que ainda há um longo caminho de expansão do uso desses fármacos no Brasil. “O valor elevado ainda é um fator dificultador de democratização do acesso desses medicamentos para a população em geral, além deles não estarem disponíveis na rede pública de saúde. É preciso apostar em políticas públicas, com a adoção de tratamentos mais modernos no SUS, para que a maioria dos cidadãos tenha condições de utilizá-los tanto para o controle da diabetes quanto para a perda de peso”.
Outro aspecto mencionado por Alessandra é a importância do uso desses medicamentos para pacientes que não conseguem emagrecer somente com controle de alimentação e mudança de estilo de vida. “Vale lembrar que a obesidade, assim como a diabetes, é uma doença crônica recidivante, que muitas vezes não pode ser tratada somente com mudança de hábitos. Ainda precisamos evoluir muito nesse olhar, tirando a culpa do colo do paciente e entendendo que há outros fatores envolvidos, sendo a medicação uma importante aliada para ajudar na perda de peso”, conclui.
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