A memória precisa ser exercitada, assim como qualquer outro sistema do organismo humano.
Não se preocupe em entender.
Viver ultrapassa o entendimento.
Clarice Lispector
Uma das queixas mais comuns com o passar do tempo é a falta de memória. Segundo o médico especialista em Geriatria e Gerontologia, Norton Sayeg, este é um evento tão frequente que muita gente ainda acredita que é normal e inexorável do processo de envelhecimento. “Mas isso não é verdade”, afirma o profissional. “É comum, mas não é normal. Este é um problema que pode ser tratado e curado, embora até há pouco tempo a medicina não estivesse instrumentalizada para fazê-lo”.
Um dos riscos, segundo Sayeg, é agravar a situação com a indicação de certos produtos sem nenhuma sustentação científica, que não apresentam resultados, privando o paciente de uma avaliação geriátrica correta e do tratamento efetivo. “Não existem drogas para melhorar a memória”, afirma o médico. Geralmente, a perda de memória é devida a algum fator que, se corrigido, devolve ao indivíduo a função que estava prejudicada.
Sayeg alerta que um dos grandes vilões é o uso de calmantes e remédios para dormir, os hipnóticos. “Os brasileiros são grandes consumidores de tranquilizantes, e é extremamente comum que o uso indiscriminado dessas drogas intoxique o usuário, levando-o a quadros graves de rebaixamento intelectual, agitação, delírio e confusão mental”, informa o médico.
Entre as causas mais frequentes da perda de memória está a depressão que se caracteriza por dificuldades para dormir e mudança no padrão de apetite. Mas os tratamentos de estados depressivos são eficazes e seguros, fazendo com que a memória seja restabelecida e o sono regularizado, sem a necessidade de uso de medicamentos.
Há ainda outras hipóteses para a perda da memória, tais como a diminuição do desempenho da glândula tireóide (hipotireoidismo), o uso de certos medicamentos para pressão alta, gastrite e outros distúrbios normais da idade, problemas sensoriais como a visão e especialmente de audição, a falta de estímulo sociointelectual, deficiência de certos nutrientes e abuso de álcool. Norton Sayeg destaca que a informação é fundamental para que, ao primeiro sinal de comprometimento da memória, se faça uma investigação clínica completa, para identificação da causa e instituição imediata do tratamento.
Todas as pessoas em algum momento esquecem várias coisas. Tais como onde colocaram os óculos, as chaves do carro, a caneta e até eventos importantes, como datas de aniversário de parentes ou de casamento. Esses esquecimentos fazem parte do dia-a-dia e são naturalmente aceitos quando ocorrem com adultos jovens. “Esses lapsos de memória não são valorizados e já estão incorporados na maneira de ser das pessoas, não trazendo maiores preocupações”, diz o profissional.
Já quando esses fatos ocorrem com pessoas de mais idade são mal interpretados e algumas vezes levantam suspeitas de início de algum problema mais sério. O pior desses rótulos é quando se diz que ‘vovó está esclerosada’ e se aceita como fato normal. Especialistas em envelhecimento há muito já estudaram os problemas com a memória e comprovaram que o passar do tempo traz ao organismo diminuição gradativa de várias funções, existindo uma maior dificuldade de se reter algumas informações.
A esse estado os cientistas denominaram Prejuízo da Memória Associado à Idade (PMAI). Isso significa que apesar de haver um declínio nesse campo, essa não é uma alteração que se deva relacionar obrigatoriamente como uma doença. Se não interfere nas atividades da vida diária e tampouco representa deficiência mental, é passível de ser contornado por meio de tratamentos eficazes, como exercícios que estimulam a atenção, elaboração de listas de afazeres, jogos de memória, associações de fatos, objetos, nomes, fotos e outros métodos de ativação da memória.
Os problemas com a lembrança podem estar associados a inúmeras causas, sendo as mais comuns o cansaço, solidão, tristeza, depressão, estresse, uso abusivo de álcool, uso indevido de medicações calmante e hipnótico ou falta de concentração. Muitas vezes uma dieta balanceada, com a suspensão de certos medicamentos, o uso de óculos e aparelhos auditivos, remoção de cerume dos ouvidos e outras correções desses fatores desencadeantes, melhoram substancialmente e até resolvem os transtornos da memória, explica o geriatra.
Quando perda de memória é doença
Para se saber se os problemas de memória podem significar sinal de doença é preciso observar se há agravamento progressivo e se chegam a interferir com as atividades do dia-a-dia. Quando isso acontece, transformam-se em real preocupação médica. Mesmo em idades avançadas, um comprometimento da memória deste tipo não é normal, merecendo uma avaliação clínica completa para pronta detecção da causa.
Existem várias doenças tratáveis e passíveis de cura que se manifestam com predomínio de perda de memória, distúrbios no comportamento e dificuldades em fazer julgamentos e raciocínios lógicos. É, portanto, importante que ao primeiro sinal desses sintomas se consulte um profissional para que o limite entre o normal e a doença possa ser estabelecido com segurança.
Como melhorar a memória?
Sempre se pode melhorar o desempenho da memória, afirma Sayeg, basta que não se aceite passivamente o declínio, mantenha-se ativo, faça-se novos amigos, cursos, leituras, visitas. Também é importante ler pelo menos as manchetes de um jornal diariamente, fazer palavras cruzadas e procurar aprender sempre alguma coisa nova, como idiomas, lidar com o computador ou se adequar às novas tecnologias.
Um bom conselho, de acordo com o médico, é reservar um período do dia para trabalhar a memória, buscando um local da casa com boa iluminação e silencioso para o este treino. Assegure-se que só será interrompido se absolutamente necessário e procure se exercitar. Anote tudo que for importante em um caderno ou uma agenda e participe de jogos que envolvam o raciocínio. Seja uma pessoa flexível, esteja aberta para ouvir.
As pessoas que não são flexíveis acabam sendo excluídas do seu meio social. Quando lhe fizerem uma pergunta e não puder lembrar-se da resposta imediatamente, não se sinta constrangido, use recursos para ganhar tempo extra, sorria, ajeite os óculos, repita a pergunta, respire fundo, limpe a garganta e pense com calma. Quando não entender direito o que foi dito, peça que repitam. Também é aconselhável manter uma dieta saudável, beber muito líquido e andar pelo menos 30 minutos por dia, evitando tensões desnecessárias. A saúde mental influencia de maneira decisiva a qualidade de vida das pessoas.
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