O padrão cerebral do perfeccionismo parece algo positivo, mas no fundo, esconde algo que afasta a pessoa de seus maiores desejos e das maiores oportunidades ao longo da vida.
Um estudo realizado pelas Universidades York St. John e Bath, no Reino Unido, mostra que houve um aumento significativo nos índices de jovens que se consideram perfeccionistas entre os universitários recém-formados. Outra pesquisa realizada pela Universidade de West Virginia, nos Estados Unidos, indica que duas em cada cinco crianças e adolescentes são perfeccionistas, o que é preocupante, afinal, essa tendência não só gera impactos práticos, mas pode ter conexão com condições clínicas preocupantes como depressão, ansiedade, compulsão alimentar, anorexia, bulimia, insônia e mais.
Uma das muitas interpretações perigosas é a crença de que o perfeccionismo é um “defeito positivo”, já que, muitas vezes, o perfeccionista acredita que está pensando nas outras pessoas quando cria sua lista de exigências mental, o que não passa de um engano, uma vez que mesmo que o outro esteja esperando algo do perfeccionista, ele nunca fará imediatamente, pouco importando o outro. “O perfeccionismo é muito mais sobre a própria pessoa que o outro”, diz André Buric, especialista em neurociência comportamental.
“Se realmente colocasse o outro em primeiro lugar, o perfeccionista teria ajudado muito mais pessoas, feito muito mais projetos, afinal, há muita gente precisando do que conhece, de suas habilidades, mas mesmo que neste instante eu possa ajudar com o que o outro precisa… o outro precisa esperar eu sentir que é a hora certa.”
Para o perfeccionista sempre vai faltar alguma coisa: seja um conhecimento, uma habilidade, algum recurso… O foco no que falta acaba sendo tão intenso e tão pesado, que ele sequer consegue iniciar as atividades mais importantes. “Ele cai no paradoxo da perfeição e se priva de viver as experiências que poderia. Paradoxo porque, mesmo que a perfeição seja inatingível, se há algo que leve alguém no sentido da perfeição, é começar, e não esperar.”, completa Buric.
Por isso, se você se identifica como perfeccionista ou convive com um, é importante refletir sobre o padrão da perfeição, veja abaixo:
Perfeccionismo é uma prisão
É preciso perceber todo o prejuízo que o perfeccionismo causa, quantos relacionamentos nunca existiram, quantos projetos não foram feitos, ideias, ocasiões e oportunidades perdidas devido a uma vida travada na expectativa de um momento perfeito para entrar em ação. Acontece que o momento nunca chega, já que nada é perfeito.
O perfeccionista precisa refletir que o ser humano está em frequente aperfeiçoamento e que a vida é a soma de vários processos, relacionamentos, atividades e habilidades e que tudo pode ser aprimorado. “O perfeccionista se leva a sério demais e não permite o erro. A vaidade é tão grande, que ele não se permite errar. É como um jogador de basquete que nunca arremessa, porque pode errar e ser vaiado.”, exemplifica o especialista.
Perfeccionismo não é um “bom defeito”
Em entrevistas de emprego, perfeccionismo é um dos defeitos mais destacados pelos candidatos. No fundo, eles dizem que são perfeccionistas porque querem de alguma forma impressionar, como se esse fosse um “bom defeito”.
“Sabe o que eu penso quando alguém se candidata para trabalhar comigo e diz que é perfeccionista? Eu entendo o seguinte: ‘eu até quero dar o meu melhor, sabe, André… Mas eu venho em primeiro lugar. Se minha vaidade não for satisfeita, não importa que tenham clientes esperando, que alguém esteja contando com o meu trabalho, nem me preocupo com o prejuízo que minha falta pode gerar. Se eu não achar que o que estou fazendo é bom, eu não vou fazer, mesmo que precise ser feito'”, diz André.
Agora, pense bem: será que existe algo positivo nesse comportamento? Será que existe algo de bom em um defeito que te priva de oferecer seu ponto de vista em uma reunião, que te impede de começar aquele projeto que você sabe que pode ser grande, que não te deixa se aproximar de alguém que você quer conhecer?
Uma coisa é agir e buscar sempre a melhoria, não descansar enquanto julgar ainda insatisfatório. Outra coisa é nunca começar.
Encontre as causas do perfeccionismo
Enquanto o perfeccionismo existir, oportunidades são abandonadas pelo caminho. Mas de onde vem o perfeccionismo? Quais são suas causas e como nós podemos destruir esse padrão na raiz?
É preciso entender que ninguém é perfeito, mas somos todos aperfeiçoáveis. Enquanto aquele 1% de pessoas que movem o mundo entrega tudo o que têm para gerar cada vez mais valor, mesmo que comece pequeno e devagar, os outros 99% estão esperando explodir, começando do alto, exatamente como eles fantasiam, coisa que nunca vai acontecer. Mas para eliminar essa trava definitivamente, você só precisa assumir a consciência de que o perfeccionismo não é você, mas um padrão que você vem treinando constantemente, e que pode ser reprogramado.
Essa transformação começa com o entendimento de como seu cérebro funciona. E de perceber que algumas pessoas treinaram seus cérebros a focar mais nos riscos, e outras nas oportunidades e nos ganhos. Algumas focam mais em como ajudar os outros, e outras em seus próprios egos. “A mudança começa quando o indivíduo começa a observar o que ele tem, para tirar o ego do centro e começar a priorizar os outros”, diz Buric.
Ainda sobre o pensamento de que o perfeccionista só está buscando o melhor, e que eliminá-lo seria fazer de qualquer jeito, mesmo que ruim. “Mas não se trata de fazer qualquer coisa, de qualquer jeito, mas sim de fazer o melhor que você pode com o que tem disponível. Quando você entende que pode, sim, gerar muito valor agora, que as pessoas podem ganhar muito com o que você faz, que seu potencial é ainda muito maior do que você imagina, essa sensação se torna viciante”, finaliza Buric.
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