Os casos de morte em decorrência da pandemia no Brasil não param de subir, e infelizmente alguns amigos, parentes e conhecidos entraram para essas tristes estatísticas. Alguns deles ainda lutaram pela sobrevivência, levando um pouco de esperança à família, mas em alguns casos, o vívus foi fatal. E se para os adultos é difícil assimilar a situação, dar a anptíicia para as crianças também não é nada fácil.
Por mais desconfortável que possa ser, é essencial entender e transmitir aos pequenos a naturalidade desse momento, que é parte do ciclo da vida. “A conversa deveria tomar lugar de forma natural, gradual e ilustrativa e não apenas mediante o evento em si”, diz Dra. Francielle Tosatti, pediatra e especialista em emergências pediátricas.
Dra. Francielle lembra que a maioria das crianças já teve, de certa forma, algum contato com a morte no dia a dia, ao ver um inseto morto, uma flor murcha ou o tema em filmes, como Rei Leão, Bambi, Frozen e outros.
A pandemia deixou o tema mais próximo e palpável por conta das informações na mídia ou mesmo por conta de familiares e conhecidos que tenham partido por conta da doença. “Por isso, tão importante quanto falar sobre morte é entender que a criança sente o luto, de acordo com sua idade e maturidade e cada criança irá reagir de uma forma a ausência, ao clima da casa e as emoções dos familiares”, conta a pediatra.
O luto por idade
0 a 2 anos
Até os dois anos a criança percebe a morte como uma ausência, sendo fundamental manter a proximidade com os familiares sobreviventes e que outro cuidador assuma as responsabilidades, no caso de perda de um cuidador próximo, como pais ou avós, sempre mantendo a constância da rotina.
3 a 6 anos
A criança começa a assimilar a morte, mas ainda de uma forma muito fantasiosa. “É importante ter muito cuidado com o uso de metáforas como ‘dormiu para sempre’ ou ‘fez uma longa viagem’, pois podem gerar fobias na hora de dormir ou viajar, além de não contribuir com a assimilação da finitude do evento.”
A visão egocêntrica comum nessa faixa etária pode levar a criança a se sentir culpada, adotar comportamentos hostis ou ter regressões de comportamento. Reafirmar constantemente que a criança não teve culpa, acolher e ajudá-la a expressar seus sentimentos fazem parte do suporte que ela precisa e que não só vai curar mas ajudar a entender o luto. De acordo com a pediatra, expressões artísticas como desenhos, tabelas de sentimentos e álbuns de lembranças são facilitadores desse processo.
9 anos
Por volta dessa idade a criança começa a entender a morte como algo definitivo e irreversível e podem requisitar meios concretos para entender a morte, como participação do funeral. Essa é uma possibilidade que fica sujeita à decisão da família, dos seus valores e da sua religiosidade, segundo Dra. Francielle: “é importante que seja uma opção para a criança e não uma imposição. Caso a decisão seja levar a criança, e ela deseje ir, explique como vai ser antes e esteja pronto para trazê-la de volta para casa se ela não quiser ficar”.
E como abordar a Covid-19?
Se algum membro da família ou amigo próximo adoecer, é importante tentar incluir a criança no processo desde o começo, para que ela assimile uma cronologia dos acontecimentos. Pais e cuidadores devem estar preparados para responder suas perguntas (que podem ser repetitivas), de forma clara e sem detalhes desnecessários.
“Abra espaço para que ela expresse seus sentimentos (o lúdico é um excelente facilitador) e ajude-a a entender o que está acontecendo”, ensina Dra. Francielle, “mantenha a criança informada da evolução, em casos de internações, havendo a possibilidade de uma televisita pergunte a criança se ela deseja participar e antecipe para ela o que ela irá ver: estado de saúde, emagrecimento, dispositivos que possam estar conectados ao corpo etc. Assegure-a de que se ela não quiser ver está tudo bem e que você dará notícias”.
Se houver falecimento de um ente querido, a criança deverá ser comunicada assim que possível por um cuidador com quem ela tenha vínculo afetivo e em quem confie. “Essa dolorosa realidade será suportável com o afeto, o amor e o respeito dos familiares.”
Também é importante que o adulto não esconda ou falseie suas próprias emoções. Está tudo bem dizer “estou chorando porque tenho saudades”, segundo a médica, pois assim, essa vivência ajudará a criança a entender que entrar em contato com sentimentos dolorosos é possível e que a medida que o amor dos nossos queridos nos conforta, as emoções se transformam em lembranças saudosas.
“Uma das homenagens mais lindas, na minha opinião, e que costuma ser bem assimilada por crianças é plantar uma rosa ou outra flor para o ente querido, explicando que ele nunca será esquecido e estará sempre no seu coração.”
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